segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Os estímulos para a infância

Tenho escrito muito sobre a cobrança social e o mercado de consumo porque vejo uma onda espessa e sempre crescente assombrando os pais atuais, no sentido de dizer-lhes como criar seus filhos e o que devem fazer para que esta função cumpra seus objetivos.

Desde que um casal engravida, começam as sugestões, quase obrigatórias, de quais livros ler, o que comprar para o enxoval do bebê, quais cursos deve fazer para se preparar para amaternidade e paternidade e assim por diante.

Há pouco tempo tive a oportunidade de ouvir uma nova mamãe (ainda grávida) contar tudo o que lhe disseram ser necessário para esperar o nascimento do bebê. Onde comprar os produtos, quais as marcas mais indicadas, a quantidade de cada coisa, etc. O curioso foi que a maioria dos aparatos necessários eram supérfluos e serviam para deixar a mãe livre de algumas de suas funções maternas, alem de liberá-la da deliciosa oportunidade de estar com sua cria.

Este mercado gigantesco de produtos a serem consumidos, para uma “educação de qualidade”, não para de crescer e parece não ter fim. Atrelado a ele vem a perigosa idéia de como garantir o sucesso dos filhos. Muitas aulas esportivas e artísticas, em lugares determinados, que caem na graça dos pais, farão da criança uma pessoa de sucesso, bem estimulada. Aliás, a palavra estímulo nunca falta, quando se trata da educação. E o que seria um bom estímulo? Há um termo técnico, nunca mencionado, mas sabido por muita gente, que é hiperassimilação. Em linhas gerais, significa que a pessoa assimila muitas coisas do meio, porém não pode se apropriar das mesmas devido ao excesso! Atualmente,a várias crianças sofrem deste mal!

Uma vez pescado por esta corrente mercadológica da educação-para-o-profissional-de-sucesso torna-se difícil enxergar o próprio filho. Antes disso, a visão para dentro de si mesmo torna-se turva, desfocada. Muitos pais atuais têm dificuldade de olhar para seus filhos, ocupados que estão em buscar, em seu meio social, o que devem fazer em cada etapa. Assim sendo, quando a criança apresenta um comportamento autêntico, ou sequer diferente do que haviam programado para ela, é vista como uma criança problema. No mínimo, interpretam que precisa da ajuda de um profissional, a fim de adquirir o que foi planejado para seu desenvolvimento. Nesta perspectiva, toda criança moderna precisa saber nadar, tocar um instrumento musical, dançar balet, se for menina e jogar futebol, se for menino, falar inglês aos três anos de idade, ler e escrever antes dos 6, dormir sem a presença dos pais, e por aí vai uma infinidade de comportamentos adequados e necessários.

Onde estaria o tão perseguido sucesso? No futuro? Na carreira? O que se espera para o filho é bom para ele ou para os próprios pais? Quando algum comportamento sai diferente do esperado, significa que houve uma falha na educação? O que dizer das crianças indomáveis por natureza? O que dizer daquelas que só conseguem fazer aquilo que tem sentido para elas e não se adaptam a situações programadas por adultos que estão distantes de seu universo infantil?

Estas crianças são as mais capazes de nos dizer o que é ser criança e o que uma criança realmente precisa. Para ilustrar, quero lembrar as inúmeras meninas, de 3 e 4 anos, que querem ser bailarinas! Não é raro uma menina querer ser bailarina. Isto está no imaginário das mulheres e é transmitido de geração em geração. Há magia na bailarina, em sua sapatilha de ponta, em seus rodopios e em seu saiote de tule. Pois bem, as meninas que manifestam empatia ou até mesmo uma identificação com esta personagem necessitam, mais que tudo, a oportunidade de desempenhar este papel, tal qual está em seu imaginário. Um par de sapatilhas, fantasias de tule e véus, confeccionados amadoramente, deixam qualquer criança pronta para ser a melhor bailarina de todos os tempos! Querer ser bailarina com 3 ou 4 anos nem sempre diz de querer ser uma profissional da dança. A menina-bailarina precisa de espaço e tempo para se desenvolver. Precisa do olhar delicado da família para valorizar sua imaginação.

Não é raro escutar pais e mães contando, perplexos, que suas filhas pediram muito para dançar balet, mas fazem algazarra durante as aulas e/ou não desenvolvem a coreografia programada no dia do festival! Estas crianças não têm um problema. Apenas são crianças necessitando exercitar sua criatividade, seu conhecimento de mundo e a busca por saber quem elas são. Ao contrário do que interpretaram sobre elas, precisam ser a bailarina que desejam, que conseguem compreender e não de aulas de balet para formar bailarinas.

A vida em família e a vida de uma criança pode ser mais simples e ao mesmo tempo mais profunda que o mercado de consumo nos propõe. Basta estarmos conectados conosco, atentos ao desenvolvimento dos nossos filhos, à sua maneira de ser e à própria infância. Assim estando, pode-se descobrir que os melhores estímulos para uma criança crescer feliz e se desenvolver bem estão na simplicidade da brincadeira tradicional, da convivência familiar e social.

Dri

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